13 julho 2010

Pena de Dumbo e as religiões

Por Eraldo Paulino


"As pessoas tem que acreditar
em coisas invisíveis pra fazer o bem
Tudo o que se vê não é suficiente
E a gente sempre evoca o nome de alguém"
(John - Pato Fu)

Quando era criança, lembro de ter visto o filme do Dumbo, um elefante que tinha as orelhas tão grandes que com elas podia voar. O filme mostra que alguns corvos percebem que aquele defeito (orelhas enormes) do elefantinho poderia tornar-se em uma grande virtude, mas não conseguiam convencer o animal depressivo disso. Para tanto, os corvos deram uma pena qualquer para o Dumbo, e convenceram-no de que aquela pena tinha poderes mágicos, e com ela ele poderia voar, bastando que ele batesse as enormes orelhas como asas. Funcionou. O elefante aprendeu a voar acreditando no poder da pena. Mas na hora da apresentação ao público da façanha, o elefante perdeu a pena, daí os corvos tiveram que convencerem-no de que a pena era uma mentira, e que na verdade o elefante voava porque simplesmente tinha essa capacidade. E com muito custo conseguiram, inclusive.
Para mim, essa história é o arquétipo das religiões, que utilizam simbologias para convencer os fiéis a fazerem o bem. Na verdade, gostaria de associar a estória do Dumbo ao processo de amadurecimento na fé. Pois, pergunto eu, como já perguntei antes aqui inclusive: Se inventássemos uma máquina do tempo para voltarmos dois mil anos atrás e descobríssemos que Jesus não ressuscitou ao terceiro dia e nem fez todos aqueles milagres tal como a Bíblia diz, será que ainda restariam muitos cristãos na face da terra? Provavelmente não.

Os corvos poderiam arranjar qualquer pena e dar ao Dumbo, e com isso continuar enrolando o "cara". Mas não. Preferiram revelar a verdade num gesto de amor. Entretanto, as religiões quase nunca fazem isso. Elas se apegam (e fazem apegar) mais à pena do que com a superação pessoal e social dos fiéis. A pena, ao invés de ser instrumento de um vôo libertador então acaba sendo um instrumento de dominação, segregação, e, por que não dizer, de burrificação. Toda fé que não amadurece ao ponto de perceber que a pena é uma mentira (bem intencionada ou não) é uma fé burrificada, superficial e demasiadamente apegada à instalação hidráulica em detrimento da água.

Um pastor que admiro muito (Carlos da Igreja Metodista) certa feita disse que a maior descoberta da vida dele foi perceber que Deus não é cristão. Está certo ele. Deus não é cristão, não é islâmico, não é hindú, etc. As religiões são dispensáveis. Deus não é, se for um Deus que até usa a estratégia da pena, mas que no fim contribui para que seu amigo (isso mesmo) voe por si só, mas não para si só, que seja verdadeiro e lute pelo que é verdadeiro, que tenha fé mas não renegue a inteligência. Se na tua igreja não te disseram que Adão e Eva e toda a bíblia são metáforas da vida e não A VERDADE ABSOLUTA, por exemplo, desconfie. Podem estar querendo que tu fiques dependente da pena, pra que na verdade tu fiques na mão de corvos malvados.

"É certo que milagre pode até existir
mas você não vai querer usar
Toda cura para todo mal
Está no Hipoglós, no Merthiolate, Sonrisal"
(John - Pato Fu)